segunda-feira, 9 de maio de 2016

O amor, Maria?

O amor, dona moça, é coisa danada. É das insignificâncias mais bonitas da vida- digo insignificância porque o amor, quando é, é leve feito pássaro avoando efeitando céu. O amor é o barquinho na voz de Nara. É coisa que faz cócegas por dentro, aquece a barriga como chocolate quente no inverno. Danado de bonito, essa coisa de amor. Não é sempre doce, te aviso Maria. Tem dias que por dengo é mais vermelho do que merecia ser. Nem sei se o amor é vermelho, ele tem tanta cara de ser cor clara. Acho que o amor tem cor de algodão doce vendido na rua, aos domingos. Às vezes, o amor atravessa a gente, feito cavalo solto e você não consegue domar. Não adianta, essa coisa meio que vem pra gente não ter o controle.

Ah, o amor é tanta coisa, Maria. Se for uma menina de sorte, vai sentir. Os joelhos frouxos, o nózinho na garganta, o sorriso bobo brotando de cantinho. O amor primeiro nasce na boca, Maria. E não através dos beijos, mas dos sorrisos que ele traz junto. Depois vai pros olhos! Ah, esses olhos tão grandes de coruja que tem ficarão com o mundo dentro deles.Você vai sentir medo, tentar fugir, ignorar. Mas o amor é feito samba. O batuque, que começa lá dentro, primeiro é pequeno e quando se vê já se derramou por você. É feito planta também, tem que regar todos os dias e dar banho de Sol. É as histórias de Zezinho, o banho de mangueira no verão. O amor é uma morada, uma paz do colo, o sereno jeito do tempo desatar. O amor é dar as chaves. Ah, pequena, não feche suas portas para o amor. Eu sei, às vezes, o amor é ingrato - nestes dias, você vai chorar, se culpar por ter mantido o tantinho de esperança de amor dentro de você. Ele é bonito mesmo nestes dias, é a prova dos nove de que você, pequena, ainda vive. Então, se deixe viver o amor em sua completude de risos e lágrimas. Maria, o amor tem gosto de jujuba, de sorvete em dia bem quente, de colo de mãe pra pegar no sono.

O amor é tão bonitinho, Maria. Ele bagunça os cabelos, conta os cílios, mede as mãos, entrelaça-as em sonhos bobos. É bobalhão feito Dom Quixote. Amor é desapego, se jogar sem pensar. Ah, mocinha, você já quer dormir, né? Amanhã conversamos mais, vou deixar escrito aqui, ó, A-M-O-R. Até no papel ele fica bonito.

Menina-Girassol

Desde pequena, Maria, foi menina-girassol. Ainda muito nova - novíssima! - preferia girassóis às pessoas. Era como uma luz de pequena clareira -imóvel e só- no mundaréu de luzinhas que piscavam freneticamente. O ritmo, as luzes, os sons, atingia Maria no seu íntimo de vida. Na maioria dos dias, ela, sem entender, imóvel se amedrontava. Maria cresceu enfeitiçada pelas histórias, histórias quaisquer, restinhos de agonia que frutificava com ela. Histórias que Zézinho contava na rua, histórias que ouvia -sempre quietinha- nos cantos. Apaixonou-se pelo silêncio confortável de quem mais observa que vive. Silêncio eterno viajante. Maria se apaixonou pelas janelas de ônibus. Às vezes, pegava os maiores caminhos só ficar nas janelas e junto ao silênico se aproximar de sua zona eterna de conforto da imaginação. Maria se encantou por cidades calmas com ruas de ladarinho antigo em que, por vezes, sonhava ouvir suas notas como num samba antigo. A menina-girassol desembocava no mar - todas as manhãs! Entre automóveis e pessoas-maquinas, com tantos moinhos de afeto, Maria insistentemente sonhava.

Me alugo para sonhar

Dancei com o silêncio e a valsa que no começou me assustou, hoje, me abraça. Tempo de depuração é bonito - chega o dia que não basta abandonar roupas, limpar o quarto, trocar o cenário. É preciso mais. É preciso se despedir daqueles 3 anos de textos pra finalmente se sentir o você-do-agora. É um acolhimento do eu, confortável e carinhoso. E assim vamos, andando devagar pra atrasar o fim do dia. Trocando as páginas, mudando as fases. Hoje, começo por aqui - me alugando sem medo para sonhar.